Quando o trabalho se torna estressante e insuportável inicia-se uma busca por saídas que permitam manter o emprego e ao mesmo tempo superar a fadiga, a raiva, a irritabilidade, o desânimo e a dor física. A vontade de jogar tudo pelos ares só é contida pela possibilidade da penúria.
Com o intuito de ajudar, amigos e familiares dão conselhos, porém nem sempre compreendem o problema ou têm os recursos para saná-los. Tais opiniões e pressões podem até piorar a situação, já que geram mais angústia. Afirmações do tipo “Reaja! Tudo depende do seu poder mental”, “você tem sorte da ter esse trabalho, já que tem tanto desempregado por aí”, “depois que tirar umas férias você vai melhorar” etc. causam irritação, frustração, sentimento de aprisionamento e não fornecem nenhum meio prático para lidar com o problema.
Primeiramente, devemos reconhecer nossos recursos físicos, sociais, cognitivos e psicológicos. São eles as nossas fontes de energia para que possamos executar nossas tarefas desejadas e indesejadas. Veja o que são:
Físicos
1- Capacidade física para fazer um determinado trabalho.
Ex: – Um construtor civil, uma faxineira e um dançarino precisam ter resistência física.
2- Ambiente em que o trabalho é executado( local aberto, estar diariamente em ambiente abafado…estreito…solitário…escuro…perigoso… ensolarado…).
Ex: – Uma cozinheira, um salva-vidas e o operário da metalúrgica precisam suportar locais quentes.
3- Exigências da função como: acordar cedo, carregar peso, caminhar longas horas, , trabalhar em local barulhento, ficar muitas horas em pé, lidar com um número grande de pessoas etc
Ex: – O motorista de ônibus tem que fazer o mesmo circuito dentro de um tempo estabelecido, sentado e em ambiente com muitas pessoas estranhas.
Estar numa atividade em que não temos as condições físicas adequadas ou o ambiente nos seja incômodo, certamente irá nos levar a um processo de exaustão.
Sociais
1- Capacidade de se conectar e criar laços com outras pessoas e desenvolver projetos em comum.
Ex: – Pessoas que formam uma cooperativa, uma ONG, um bloco de carnaval ou uma banda musical. A capacidade de interagir harmoniosamente com as pessoas que fazem parte do ambiente de trabalho.
2- Estar bem(ou não) na posição de líder ou de subordinado, sabendo administrar interesses conflitantes.
Ex: – O professor tem que lidar com agitação de uma turma e se fazer respeitar.
3- Ter capacidade de requisitar apoio de outros(ou se travar), incluindo forças sobrenaturais(Deus, meditação, macumba etc)
Ex: – O profissional que não consegue reinvindicar melhores condições, pois teme ser despedido.
4- Se encontrar pessoalmente ou por vias indiretas com clientes, se expressar em reuniões etc.
Se não conseguirmos lidar com as relações, sabermos quando avançar e recuar e nos comunicarmos eficientemente iremos nos exaurir.
Cognitivos
1- Capacidades intelectuais naturais(facilidade para aprender as coisas) e as habilidades adquiridas(qualquer coisa que nos foi ensinado durante a vida).
2-Capacidade de se concentrar.
3- Facilidade ou difculdade de planejamento e organização de tarefas.
4- Entendimento ou falta de conhecimento sobre algum assunto específico.
5-Perícia(ou falta de) na execução de uma tarefa.
6- Facilidade para resolver problemas.
Se nosso trabalho exige mais habilidades do que realmente possuímos, isso nos deixará bastante estressados. O contrário também é verdadeiro.
Psicológicos
1- Capacidades psicológicas e suas manifestações emocionais, tais como empatia, autoconfiança, autodisciplina, resistência as tentações etc.
Ex: – A confiança do empresário em seu novo produto.
2- Situações em que nos sentimos nervosos, tristes, excitados, confiantes, otimistas, medrosos, raivosos, deprimidos etc.
Ex: – O medo do carteiro ao ter que entregar correspondências em locais violentos.
Se executamos um trabalho que nos deixa inseguros, nervosos, com raiva, com medo ou deprimido, certamente o burnout está a caminho.
Agora que está mais claro quais são as fontes de energia, é preciso:
1- Saber identificar o que te consome/desgasta/exaure e o que te renova, recompõe, energiza.
2- Estar atento as condições e comportamentos que causam mais impacto nos seus recursos pessoais.
Faça da seguinte maneira:
Pegue lápis e papel para listar tudo o que você não tolera mais em seu trabalho. É preciso ser detalhista, vá desde o caminho para o trabalho, o ambiente físico, as pessoas que você tem que lidar, as tarefas que você tem que fazer, a roupa que você tem que usar, o salário que você ganha, os direitos que você tem, o poder que você tem, os horários que você precisa trabalhar, a influência desse trabalho na sua família etc. Não racionalize! Vá colocando tudo o que vier a cabeça e que te cria desconforto, raiva, cansaço, frustração, medo etc. Assim você está identificando o que consome energia.
Vou colocar uma história como exemplo(fictícia) para que fique mais claro(se você já entendeu, pode pular a historinha):
X é professora de danças de salão(haha!! eu já fui… na pré história). Não aguenta mais o seu trabalho, embora adore dançar e ensinar. Trabalha 4 horas por noite 4 x na semana. Tem um ajudante para aulas e um número pequeno de alunos, mas suficiente para mantê-la independente, embora o movimento de alunos seja flutuante e nos períodos de férias chegam quase a zero. Dá algumas aulas particulares durante o dia em sua casa, especialmente no sábado. Trabalha em uma academia de dança, que durante 2 anos deixou X com a incumbência de recolher os pagamentos de alguns alunos, e isso criou uma série de desconfortos para X, pois tem que cobrar os alunos que estão em atraso e ao mesmo tempo dar aulas e eles.
As finanças de X não permite que viaje para os locais em que poderia se reciclar, então tem o sentimento de ficar para trás. X gosta do contato com os alunos e de ir a alguns bailes com muitos deles, embora os locais de dança e os grupos musicais da cidade em que X vive sejam muito ultrapassados e com pouca experiência em tocar para pessoas dançarem.
X tem que administrar diariamente os conflitos de alunos, que estão sempre reclamando dos parceiros de aula(porque dançam mal, porque têm mau hálito, porque suam demais, porque são feios, porque são velhos, porque são grosseiros, porque não vão com a cara…).
O espaço de trabalho é adequado, mas as janelas sempre abertas num local de trânsito de pessoas faz com que sempre tenham muitas pessoas assistindo as aulas. X tem liberdade de criar seu próprio método, usar as músicas que deseja e se vestir como bem entende. Os alunos estão sempre pressionando para que as aulas ocorram de acordo com suas próprias preferências em termos de estilo musical. Alguns alunos novatos ficam ansiosos em querer aprender o mais rápido possível e criticam a repetição de movimentos necessária para melhor assimilação.
X tem expectativas altas em relação ao desempenho e dedicação dos alunos, mas percebe que poucos chegam perto de tais perspectivas. X faz apresentações de vez em quando, mas é algo que ela realmente não gosta. O parceiro de x está aquém de suas habilidades e isto a incomoda um pouco. X pensa em fazer coisas legais e criativas, mas seus alunos estão mais interessados na sociabilização, ir a bailes etc.
X não tem relações com outros professores de dança e também não faz parte de outro círculo de interesses ou amizades que permitam relaxar de forma diferente. Toda conversa é relativa a dança, todos os amigos estão ligados a dança.
Para finalizar, X tem uma personalidade forte e um temperamento apaixonado, o que gera muita crítica por parte dos alunos, que têm a expectativa de ter uma professora mais dócil e maternal.
Vamos ver as situações que consumiam X:
1- Instabilidade financeira devido a flutuação do número de alunos.
2- A falta de trabalho nas férias.
3- Ter que cobrar os alunos.
4- Trabalhar aos sábados.
5- Não conseguir se reciclar ou estar conectada com seus amigos dançarinos e professores.
6- A cobrança que alguns alunos fazem de que X deveria dançar com seus alunos nos bailes. X entende que baile é um momento de lazer pessoal de não deve dançar com alguém que não queira.
7- A qualidade da música e dos bailes.
8- A constante observação das pessoas pela janela deixam X se sentindo o tempo todo criticada.
9- Os conflitos constantes por causa das demandas dos alunos.
10- A falta de bom senso das pessoas que não entendem o processo de aprendizado, pessoas que buscam o prazer imediato e sem esforço.
11- As dificuldades dos alunos são sentidas como incompetência da sua parte.
12- Ela odeia se apresentar em público.
13- As limitações do parceiro
14- A dificuldade de levar algum trabalho criativo adiante.
15 As todas as conversas e situações sociais centradas na dança.
16- As cobranças para que X fosse aquilo que ela não era.
Vamos ver as situações que restauravam X:
1- Dar aulas.
2- Estar com as pessoas.
3- Música.
4- Criar os métodos.
5- Ter liberdade para se vestir como quiser.
6- Fazer os próprios horários.
7- Tirar férias quando quiser.
8- Poder mudar de local de trabalho da noite para o dia se desejar.
Depois deste exercício, já é possível observar as principais circunstâncias que te levam a exautão no teu trabalho. O ideal agora é que tente pensar em algumas alternativas para solucionar alguns dos fatores que incomodam e analise as dificuldades nas áreas física, social, cognitiva e psicológica.
No caso de X, por exemplo, ela poderia de imediato ter conversado com os donos da academia e dizer que não gostaria de fazer a cobrança. Também poderia ter exigido o bloqueio da janela para as aulas terem mais privacidade ou trabalhar internamente a sua insegurança. Poderia recusar qualquer convite para apresentações. Mudar algumas expectativas quanto aos alunos e ao trabalho criativo ou colocar um outro tipo de energia e ação para que as coisas fossem diferentes etc. X não tem muitos problemas com relação as questões físicas, mas as situações sociais e cognitivas são bem difíceis, o que leva a uma sobrecarga de inseguranças, frustrações, raiva etc.
Identificar todos os detalhes do trabalho que estão te exaurindo é o primeiro passo para melhorar a tua condição.
Fonte: Restore Yourself, The antidote for professional exhaustion – Edy Greenblatt
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